quinta-feira, 26 de junho de 2008

Pessimismo ou Provincialismo

Diz-nos Fernando Pessoa em “O Provincialismo Português” “ in Notícias Ilustrado, n.º 9, série II, Lisboa, 12 de Agosto de 1928. “Se, por um daqueles artifícios cómodos, pelos quais simplificamos a realidade com o fito de a compreender, quisermos resumir numa síndroma o mal superior português, diremos que esse mal consiste no provincianismo.”
E prossegue “O provincialismo consiste em pertencer a uma civilização sem tomar parte no desenvolvimento superior dela - em segui-la pois miméticamente, com uma subordinação inconsciente e feliz.”
“…Os civilizados criam o progresso, criam a moda, criam a modernidade; por isso lhes não atribuem importância de maior.”
“… O provinciano, porém, pasma do que não fez, precisamente porque o não fez; e orgulha-se de sentir esse pasmo. Se assim não sentisse, não seria provinciano.”
“Para o provincianismo há só uma terapêutica: é o saber que ele existe. O provincianismo vive da inconsciência; de nos supormos civilizados quando o não somos, de nos supormos civilizados precisamente pelas qualidades por que o não somos. O princípio da cura está na consciência da doença, o da verdade no conhecimento do erro. Quando um doido sabe que está doido, já não está doido.
Estamos perto de acordar, disse Novalis (Georg Philipp Friedrich von Hardenberg, um dos mais importantes representantes do romantismo alemão de finais do século XVIII), quando sonhamos que sonhamos.”
Mais dizia Pessoa, “O nosso escol político não tem ideias excepto sobre política, e as que tem sobre política são servilmente plagiadas do estrangeiro - aceites, não porque sejam boas, mas porque são francesas ou italianas, ou russas, ou o quer que seja”, e aqui eu acrescentarei Finlandesas.
Embora não estando de acordo com a totalidade do pensamento de Pessoa na referida publicação, nos excertos acima referidos não poderia estar mais em consonância com ele.
Desde a revolução de Abril de 1974 que Portugal anda á procura do rumo certo mas, por incompetência, ignorância e outros interesses, que não os do país, temos assistido ao descalabro da vida política, onde por razões de pudor, os mais capazes, sérios e competentes, não se querem envolver.
A Justiça não funciona.
A corrupção corrói todas as estruturas da nossa sociedade.
O país ainda tem uma cultura empresarial de merceeiro, e apenas esta, porque a outra não existe.
A maioria dos políticos em exercício são “profissionais”, ou seja nunca trabalharam, no verdadeiro sentido da palavra, são fruto das escolas das diversas juventudes partidárias, uns bétinhos, outros parvos, sem carácter, seguidistas, arranjistas, enfim, a este nível, estamos mesmo a bater no fundo.
Os sindicatos não defendem os interesses dos trabalhadores, mas tão só, os interesses dos seus agentes e dos partidos que representam, tendo perdido toda a credibilidade.
As Organizações empresariais defendem apenas os interesses das grandes empresas, descurando os das pequenas empresas, servindo-se da posição dominante das suas representadas, leia-se grandes empresas, para comprar o poder político, ou não fossem estas mesmas empresas o refúgio dos ex-governantes.
As pequenas empresas ainda não perceberam, por ignorância e falta de formação dos seus proprietários, que se não aprenderem a trabalhar em parceria, organizando-se em cooperativas, tendo em vista baixar os custos e aumentar a sua produção, aproveitando as sinergias criadas, estão condenadas ao fracasso e á falência, pois se continuarem á espera de subsídios, como aconteceu ao longo destes últimos anos, estão muito enganadas pois o povo português não está disposto a pagar impostos para ver os mesmos serem absorvidos pelas gestões incompetentes e inconsequentes de uns poucos, basta!
Por outro lado quando ouvimos, na rádio ou vemos na televisão, alguns portugueses a defenderem a tese que antes do 25 de Abril isto é que isto era bom, então além de provincianos ainda temos muitos portugueses que mais não são do que pacóvios, mas não nos admiremos pois já Gil Vicente e Eça de Queirós nos relatavam muitas histórias sobre os ditos cujos, temos de concluir que temos um problema genético, e quanto a isto só o tempo resolverá.
Perante todos estes cenários é natural que exista, não algum, mas muito, mesmo muito, pessimismo.
No entanto, aquando da revolução de Abril, Portugal estava atrasado em relação a alguns países da Europa, mais de 30 anos, muitas foram as etapas já queimadas nestes últimos anos, o que é sem dúvida muito positivo, mas temos de estar atentos e não podemos deixar nas mãos dos outros aquilo que nos compete resolver, intervindo, protestando, não na mesa do café, mas sim no lugar certo e na hora certa. Cumprir com as nossas obrigações profissionais e cívicas. Isto dá trabalho, dá arrelias, mas é imprescindível que assim procedamos e nos deixemos de lamurias pois estas, não resolvem, nunca resolverão, qualquer problema da nossa vida.
Convém lembrar que, em 1973, a crise petrolífera trouxe-nos muitos mais problemas do que a actual, houve zonas do país em que num dia circulavam carros com matriculas terminadas em número par e no outro terminações de número ímpar, o país estava á beira da banca rota, não havia dinheiro para pagar as importações, no entanto conseguimos ultrapassá-la. Bem sei que então estávamos perante uma crise conjuntural. Hoje a situação é muito diferente, a crise é estrutural, mas felizmente, pertencemos á zona euro, a nossa moeda é das mais fortes do mundo e a resolução destes problemas é feita em conjunto com os nossos parceiros, não fora isto e então os portugueses nem imaginam a situação em que estariam.
O que é lamentável, e demonstra como estamos mal dirigidos a nível global, não temos líderes, é o facto de a actual crise que Portugal e o mundo em geral está a sentir, já ser esperada, pois os alertas da crise do ‘subprime’ já eram conhecidos há três anos, mas nenhuma instituição lhes deu especial atenção. Os bancos centrais reagiram bem, mas actualmente há contágio entre mercados e não apenas entre economias, resultado da globalização. O problema actual não está na liquidez mas sim no retomar da confiança no curto prazo.
Em Portugal o ‘subprime’ está associado ao crédito ao consumo. As empresas de crédito por telefone, como por um exemplo, a Mediatis, Cofidis ou a Credial, compram o dinheiro ao banco central a baixo custo, com uma taxa de juro na ordem dos 4% e concedem empréstimos quase a 30%. A situação torna-se mais preocupante pelo facto de Portugal ter um dos níveis de endividamento mais elevados da Europa e o peso dos créditos vencidos ou de cobrança duvidosa, no total de empréstimos bancários, continua a subir. No ramo da habitação, o Banco de Portugal afirma que o endividamento não é um problema significativo porque está garantido pelo património dos particulares. Mas se os bancos tomassem para si essas garantias, a oferta de casas seria enorme, pelo que o seu preço teria de baixar.
O ‘subprime’ surgiu quando a Reserva Federal norte-americana (Fed) começou a baixar as taxas de juro para estimular o mercado imobiliário com o intuito de controlar os efeitos dos ataques terroristas do 11 de Setembro nos mercados de tecnologias. Mas em 2003, a criação de emprego e o investimento empresarial estavam em níveis baixos e a taxa de juro descia para 1%. Simultaneamente, as várias instituições bancárias deixaram de ser tão exigentes nas condições requeridas para conceder créditos. Quando a Fed começou a subir de novo os juros o problema estalou. Com juros mais altos acompanhados pela queda dos preços das casas, as famílias ficaram sem capacidade para saldar as suas dívidas.
Como os mercados estão interligados e há bancos e fundos europeus com investimentos em produtos das instituições norte-americanas que operam no segmento ‘subprime’, a crise de liquidez atingiu também a Europa.
Se o problema for apenas de liquidez, a crise poderá acabar apenas através da injecção de capital do BCE. No entanto, isto depende do grau de exposição dos bancos ao mercado norte-americano. Se a falta de confiança se alastrar ao resto dos mercados de crédito, as consequências poderão adquirir uma dimensão muito gravosa.
A juntar a esta situação temos a especulação dos preços do petróleo e também nos cereais, não na sua origem, produção, mas nos mercados especulativos.
Como é evidente a subida de preços verificada nestes produtos levará, inevitavelmente, á subida de todos os outros produtos, nomeadamente a carne, leite, transportes, energia, etc.
Uma coisa é certa, os preços não voltarão a cair para os níveis de 2006, contrariamente é previsão de alguns optimistas, pois o capitalismo e especuladores não estarão dispostos, a abdicar dos seus fabulosos lucros.
Como é evidente, sendo Portugal um pais pequeno e desorganizado, com uma balança de pagamentos deficitária, importador de todos os produtos combustíveis, com um baixo índice de produtividade das suas empresas, de formação e de escolarização, sem esquecer a falta de cultura, dos seus activos, naturalmente, são maiores as dificuldades sentidas.
Temos que reverter esta situação aumentando as exportações, apostando em novas tecnologias, aumentando a formação profissional e o nível cultural dos portugueses, e isto está a ser feito, embora já tivéssemos perdido demasiado tempo. Todavia, também temos de mudar as mentalidades e isto não compete a nenhum governo mas sim a cada um de nós.
Temos de aprender a pensar com a nossa cabeça e não nos limitarmos a fazer como os carneiros que seguem cegamente o pastor.
As facilidades acabaram, o mundo mudou, acabaram-se os empregos para a vida toda, acabou-se o facilitismo, quem ainda não entendeu isto tem todas as razões para estar pessimista e bem pode esperar sentado como diz o nosso povo.
Pessoalmente estou céptico, muito céptico, mas não pessimista, o que é muito diferente. Portugal, e os portugueses, ao longo de muitos séculos de História conseguiram enfrentar e resolver os problemas que foram surgindo, ou não fossemos um dos países mais velhos da Europa, e um dos poucos, senão mesmo o único, com uma única língua e cultura.
Para terminar não resisto a citar um artigo de Miguel Poiares Maduro, publicado no Diário de Notícias “Ser optimista dá mais trabalho. Significa reconhecer que temos algum controlo sobre a vida e exige que estejamos dispostos a investir na nossa capacidade de nos transformamos e a transformarmos. Mas isso co-responsabiliza-nos. Somos co-autores da vida e não apenas os seus destinatários. É mais fácil ser pessimista e escondermo-nos no cinismo".

Delcio Vieira
TT06/08

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